terça-feira, 5 de fevereiro de 2019

Meus amigos, até breve


Depois de ter escrito um livro sobre um crime de morte ocorrido, em 1952, no Rio de Janeiro, começo a reunir material para mais um livro. Um livro sobre uma rebelião popular, que se confundiu com uma tentativa frustrada de golpe militar, no início do século passado.
Hoje, por exemplo, li duas crônicas de Olavo Bilac sobre o tema – ambas publicadas na “Gazeta de Notícias”. Conhecido mais como poeta, Bilac foi também um homem de imprensa, escrevendo crônicas e artigos para vários jornais do Rio de Janeiro e de São Paulo. Todos os assuntos o interessavam, desde os literários aos políticos, aos históricos, aos científicos, aos acontecimentos diários da vida. Acompanhou as transformações urbanas ocorridas na cidade que amou. Em 1893, durante o governo de Floriano Peixoto, Bilac passou quatro meses nos calabouços da Fortaleza da Lage, uma ilhota na entrada da Baía da Guanabara. Em setembro daquele ano, já solto, Bilac apoiou o almirante Custódio de Melo, que liderou uma rebelião contra Floriano. Bilac foi levado mais uma vez à prisão. Após prestar esclarecimentos, Bilac foge e homizia-se em Minas Gerais, território não atingido pelo estado de sítio baixado por Floriano. Bilac foi um sujeito extraordinário. Um dos cinco maiores poetas brasileiros.
Bilac era um cronista clássico, na linha de Rubem Braga, Antônio Maria, Paulo Mendes Campos. Era um observador, e não só da cidade em que vivia. Não se preocupava com que a maioria pensava, mas buscava sempre ver os meandros dos acontecimentos. Deixou-nos uma obra extensa e valiosa.
Como pretendo concluir a pesquisa e o livro até dezembro de 2019, vou me afastar uns tempos do facebook. Não vou suspender minha página, nem deixar de escrever quando julgar necessário ou imprescindível. Sei que muita gente gosta do que escrevo, como sei que muita gente detesta o que ponho na telinha. Não me importa. Aos primeiros, meus agradecimentos; aos segundos, meu silêncio.
Antes, porém, gostaria de deixar registrado meu ponto-de-vista sobre o momento que vivemos.
Devo dizer, de início, que considero a mídia social um belo instrumento de troca de conhecimentos e de informações, embora ele esteja, hoje, dominado pelas sequelas da divisão político-ideológica que domina a vida brasileira. Uma divisão que enveredou perigosamente para o campo da irresponsabilidade e do conflito, insuflando, em muitos casos, o que há de pior no chamado ser humano.
Na rede social virtual o que domina, hoje, são as mentiras, a disseminação de boatos, as agressões, os xingos, o mau humor, a torpeza. Ninguém respeita o direito de opinar e falar do outro. Entra-se no espaço de qualquer um, com a intenção apenas de ofendê-lo e desmerecê-lo pelo simples fato de que o outro pensa diferente. Tais invasões nem sempre são acompanhadas de comentários coerentes, sérios.
O grau de ensandecimento que domina o facebook está atingindo a níveis insuportáveis, e isto me preocupa em particular. Quero dizer com isso que se avançou celeremente para o desrespeito da lógica, do bom senso e da civilidade, na suposição de que todos podem falar o que quiser, quando quiser, sem medir a verdadeira dimensão do que fala. Outro dia li uma postagem tão absurda quanto irresponsável: dizia o autor que “o Exército brasileiro estava dominado pelas milícias”, que é, como se sabe, uma organização criminosa. Tal afirmação é inaceitável por que é uma baita mentira, uma enorme tonteria, uma suposição que afronta a democracia brasileira. Trata-se, na verdade, de uma provocação torpe e irresponsável. Como a rede social aceita tudo, a postagem foi lida por milhares de pessoas, que a transmitiram, que a transmitiram, que a transmitiram.
Todos sabem – e se não sabem estão sabendo agora – que não votei no Bolsonaro. Mas declarei, desce cedo, que estava curioso. Não escrevi uma só linha atacando o capitão, mas também não escrevi nada a favor dele. Preferi aguardar, embora um terceiro amigo meu tenha escrito que estava “decepcionado” comigo. Não respondi, pois a decepção do meu amigo é, na verdade, prova que estamos vivendo uma era de equívocos.
Mas tenho lido as postagens de amigos meus combatendo o governo, inclusive atribuindo a ele ações e atitudes não praticadas. Tudo isto me levou a uma certeza: muitos que atacam Bolsonaro são movidos pelo medo de que seu governo dê certo. E não me digam que estou errado. Muitos temem que o governo Bolsonaro dê minimamente certo.
Eu, de minha parte, espero que o governo Bolsonaro dê certo, não por causa dele. Bolsonaro é um homem de direita – e o Velhote do Penedo continua sendo, penosamente, sofridamente, um homem que acredita no ideal socialista. Quero que o governo Bolsonaro dê certo por causa dos 13 milhões de desempregados, dos doentes que morrem nas filas dos hospitais, das crianças e jovens que recebem uma educação pífia, da falta de infraestrutura – e por aí afora. Se nada mudar no Brasil, ao cabo dos próximos anos os miseráveis estarão mortos, os remediados serão miseráveis – e os ricos estarão nas Bahamas, usufruindo as delícias da vida.
Se o governo Bolsonaro der certo, reconheço que perdi a minha guerra ideológica, mas o grosso da população terá o direito de fazer três refeições por dia, de dormir sob um teto, de não morrer nos corredores de hospitais infectados. E seus filhos, ao invés de soldados do tráfico, estarão nas escolas.
Meus amigos, até breve.