Será uma Copa
inesquecível: a PM vai baixar o cacete!
No
momento em que escrevo, ocorre um enfrentamento entre a PM de Brasília e manifestantes
(estudantes, sem teto, trabalhadores e índios).
As
manifestações de hoje na capital federal não têm apenas a Copa como alvo. Os
índios, por exemplo, vieram à Brasília pedir a revogação das novas regras de
demarcação de suas terras. Não foram recebidos por senadores e deputados,
claro, mais ocupados no troca-troca de cargos e comissões. Dilma, como se sabe,
jamais recebeu um índio sequer, o que a faz ser única em toda a história da
República. Dilma, sem dúvida, despreza os índios – mas o governador do Distrito
Federal vai além, pois mandou a cavalaria da polícia militar atacar os índios
com bombas chamadas de efeito moral e de gás lacrimogêneo. Agnelo Queiroz, o
Búfalo Bill do planalto, que há alguns anos atrás chorava quando ouvia a voz de
Henver Hoxha, o ditador da Albânia stalinista, virou às costas para o povo.
Há diariamente várias manifestações em todo o
Brasil, um fenômeno que, hoje, acontece em todo o mundo. O que impressiona, no
entanto, é que a mídia, os analistas políticos e os especialistas universitários
não conseguem entender o que se passa, enveredando por explicações do tipo
rasteiro e preconceituoso. Nenhum comentário que vejo na televisão ou leio nos
jornais brasileiros (leio pelo menos três por dia) chega aos pés da
complexidade e do refinamento da análise feita por Francis Dupuis-Déri, em
“Black blocs”, livro lançado pela Veneta. No Brasil, os Blacks são tratados
meramente como caso policial. Dupuis-Déri, que estudou os Blacks por mais de
dez anos, defende a tese de que o principal objetivo do movimento é indicar a
presença de uma crítica radical ao sistema econômico e político.
As
greves que eclodem diariamente no Brasil é um fato que merece reflexão. Ao
chegar ao PT, Lula procurou e logrou alcançar dois tipos de aliança: de um
lado, com os empresários. Nenhum governo, nem mesmo o de Fernando Henrique
Cardoso, foi tão generoso com os empresários, especialmente com as grandes
empreiteiras e bancos. De outro, Lula aliou-se com o que há de pior na vida
política brasileira, de Sarney a Maluf, de Renan a Collor, aliança esta que se
consolidou na base do troca-troca de cargos, apoios e verbas.
Coroando
tudo, Lula tratou de cooptar os principais segmentos do movimento social, como
a CUT e a Une. No princípio, e contando com uma conjuntura mundial favorável,
Lula reinou. Como a conjuntura mundial e nacional mudou, a era PT entrou em
pane, mas nas mãos de Dilma, que, hoje, está mais perdida que cego em tiroteio.
Obras não andam, a inflação descontrolou-se, as manifestações tomaram conta das
ruas.
O
pior dos mundos é que o PT perdeu o controle absoluto que tinha sobre o
movimento sindical. Atrelado ao governo, a CUT está vendo o movimento sindical
tornar-se cada vez mais autônomo, daí as greves diárias e prolongadas, que a
central sindical petista não mais consegue controlar. Novas lideranças estão
surgindo à revelia dos “capos” do PT e da CUT.
A Copa do Mundo se aproxima e as manifestações
crescem, assim como a violência. As taxas de homicídio se expandem: de 2011 a
2012, o número de assassinatos cresceu, no Brasil, 7,9%, sendo que, em São
Paulo, o aumento foi de 11%. O índice de assassinatos no Brasil é da ordem de
29 para cada 100 mil habitantes.
Os
manifestantes, apoiados pelos Black blocs, desejam educação de qualidade,
sistema de saúde digno, segurança, transportes urbanos decentes – e que a
política seja exercida com decência, moralidade e eficiência.
Num
país tão cheio de carências, construímos estádios (vulgo “arenas”) caríssimos e
superfaturados. Ano passado, 9 recém-nascidos morreram por infecção num
hospital infantil de Ceilândia, cidade satélite de Brasília. Faltou verba para
a higienização da UTI do hospital. Uma semana depois, o governador do DF
informou ao distinto público que o estádio de futebol de Brasília ficaria
pronto bem antes da Copa – pois não faltariam verbas para isso. Não faltaram e
o estádio ficou pronto. Às nove famílias, que perderam seus bebês por falta de
verba para higienização da UTI do hospital público em que nasceram, só resta o
silêncio.