terça-feira, 27 de maio de 2014

Manifestações, greves e violência, mas em compensação temos belos estádios


Será uma Copa inesquecível: a PM vai baixar o cacete! 

No momento em que escrevo, ocorre um enfrentamento entre a PM de Brasília e manifestantes (estudantes, sem teto, trabalhadores e índios).

As manifestações de hoje na capital federal não têm apenas a Copa como alvo. Os índios, por exemplo, vieram à Brasília pedir a revogação das novas regras de demarcação de suas terras. Não foram recebidos por senadores e deputados, claro, mais ocupados no troca-troca de cargos e comissões. Dilma, como se sabe, jamais recebeu um índio sequer, o que a faz ser única em toda a história da República. Dilma, sem dúvida, despreza os índios – mas o governador do Distrito Federal vai além, pois mandou a cavalaria da polícia militar atacar os índios com bombas chamadas de efeito moral e de gás lacrimogêneo. Agnelo Queiroz, o Búfalo Bill do planalto, que há alguns anos atrás chorava quando ouvia a voz de Henver Hoxha, o ditador da Albânia stalinista, virou às costas para o povo.

 Há diariamente várias manifestações em todo o Brasil, um fenômeno que, hoje, acontece em todo o mundo. O que impressiona, no entanto, é que a mídia, os analistas políticos e os especialistas universitários não conseguem entender o que se passa, enveredando por explicações do tipo rasteiro e preconceituoso. Nenhum comentário que vejo na televisão ou leio nos jornais brasileiros (leio pelo menos três por dia) chega aos pés da complexidade e do refinamento da análise feita por Francis Dupuis-Déri, em “Black blocs”, livro lançado pela Veneta. No Brasil, os Blacks são tratados meramente como caso policial. Dupuis-Déri, que estudou os Blacks por mais de dez anos, defende a tese de que o principal objetivo do movimento é indicar a presença de uma crítica radical ao sistema econômico e político.

As greves que eclodem diariamente no Brasil é um fato que merece reflexão. Ao chegar ao PT, Lula procurou e logrou alcançar dois tipos de aliança: de um lado, com os empresários. Nenhum governo, nem mesmo o de Fernando Henrique Cardoso, foi tão generoso com os empresários, especialmente com as grandes empreiteiras e bancos. De outro, Lula aliou-se com o que há de pior na vida política brasileira, de Sarney a Maluf, de Renan a Collor, aliança esta que se consolidou na base do troca-troca de cargos, apoios e verbas.

Coroando tudo, Lula tratou de cooptar os principais segmentos do movimento social, como a CUT e a Une. No princípio, e contando com uma conjuntura mundial favorável, Lula reinou. Como a conjuntura mundial e nacional mudou, a era PT entrou em pane, mas nas mãos de Dilma, que, hoje, está mais perdida que cego em tiroteio. Obras não andam, a inflação descontrolou-se, as manifestações tomaram conta das ruas.

O pior dos mundos é que o PT perdeu o controle absoluto que tinha sobre o movimento sindical. Atrelado ao governo, a CUT está vendo o movimento sindical tornar-se cada vez mais autônomo, daí as greves diárias e prolongadas, que a central sindical petista não mais consegue controlar. Novas lideranças estão surgindo à revelia dos “capos” do PT e da CUT.

 A Copa do Mundo se aproxima e as manifestações crescem, assim como a violência. As taxas de homicídio se expandem: de 2011 a 2012, o número de assassinatos cresceu, no Brasil, 7,9%, sendo que, em São Paulo, o aumento foi de 11%. O índice de assassinatos no Brasil é da ordem de 29 para cada 100 mil habitantes.

Os manifestantes, apoiados pelos Black blocs, desejam educação de qualidade, sistema de saúde digno, segurança, transportes urbanos decentes – e que a política seja exercida com decência, moralidade e eficiência.

Num país tão cheio de carências, construímos estádios (vulgo “arenas”) caríssimos e superfaturados. Ano passado, 9 recém-nascidos morreram por infecção num hospital infantil de Ceilândia, cidade satélite de Brasília. Faltou verba para a higienização da UTI do hospital. Uma semana depois, o governador do DF informou ao distinto público que o estádio de futebol de Brasília ficaria pronto bem antes da Copa – pois não faltariam verbas para isso. Não faltaram e o estádio ficou pronto. Às nove famílias, que perderam seus bebês por falta de verba para higienização da UTI do hospital público em que nasceram, só resta o silêncio.