segunda-feira, 9 de novembro de 2015

Já vimos esse filme.


A tragédia de Mariana

O Velhote do Penedo possui um bom acervo de livros, revistas antigas, discos (LPs e 78 rotações), artesanatos, fotos antigas, microfilmes, vídeos, gravações de entrevistas, recortes de jornais. Tudo, ou quase tudo, sobre o Brasil. Um amigo disse, um dia, que a casa do Velhote lembra um sebo. Talvez.

Disse isso para informar que tenho uma caixa onde reúno material sobre desastres naturais, como chuvas, enchentes, etc. Este fim de semana – e diante do episódio de Mariana, Minas Gerais – examinei o arquivo e cheguei a uma dolorosa conclusão: em breve, o acidente vai cair no esquecimento, nada vai ser feito, o governo dirá que é ótimo, mas o povo não entende o quanto ele é justo.

O enredo varia apenas quanto o motivador da tragédia: às vezes, enchente; outras vezes, deslizamentos; agora, estouro de duas barragens de resíduos de mineração, lama e outros entulhos. O governador, o prefeito e o ministro da integração (não sei o nome) sobrevoaram o local, disseram-se estarrecidos com o que viram, afirmaram que tomarão providências – e foram embora. Missão cumprida. A presidente, desta vez, não foi ao local, mas emitiu uma nota declarando-se solidária com as vítimas. Ela tem coisas mais importantes com que se preocupar.

Deixo aqui uma previsão. Daqui a alguns dias, a mídia estará falando de outro assunto – e um sinistro e criminoso silêncio cobrirá de luto a tragédia de Mariana.

segunda-feira, 2 de novembro de 2015

Censura nunca mais


Censura, tortura e pedofilia

Eu era, nos anos 1950, um jovem atrevido e estudava no Souza Aguiar, colégio estadual da melhor qualidade, onde tínhamos professores como Paulo Ronái, Orlando Valverde, Leodegário A. Azevedo Filho, Almir Câmara de Matos Peixoto, Edmundo Moniz, Bella Jozef, entre muitos outros.

O Souza Aguiar ficava na Rua Gomes Freire, na Lapa, bairro boêmio do Rio. Tínhamos boas vizinhanças: o velho e saudoso Correio da Manhã, o teatro República (onde vi, pela primeira vez, as gloriosas coxas da vedete Nélia Paula), botecos, o Bar Brasil e diversas – digamos – casas de tolerância.

O Souza Aguiar era, como todos os colégios da época, muito cioso das regras disciplinares, mas o ensino e a qualidade dos professores eram da melhor qualidade.

Tínhamos, os alunos do Souza Aguiar, nessa época, um jornalzinho mensal, no qual publiquei os meus primeiros textos. Houve, um mês, contudo, que o meu artigo não foi publicado – tinha sido censurado pela direção do colégio. Não me lembro do artigo (era um conto), mas, segundo me lembro, a censura abrangia o tema (era uma história que se passava num rendez-vous) e o uso de palavras como prostituta, caftina, sexo, entre outras.

Protestei o quanto pude, fui à direção, conversei com professores, mas não convenci ninguém dos bons propósitos do meu conto.

Desde então criei absoluto desprezo pela censura, pelos censores, por qualquer forma de restrição coercitiva à liberdade de expressão.

Recentemente, houve uma tentativa de abertura de processo contra um dos meus livros (o que talvez mais tenha sido vendido, pois o que ganhei com ele me financiou uma viagem à Europa). Estávamos – eu e a editora – nos defendendo quando o STF, por unanimidade, estabeleceu que o “cala a boca já morreu”. Estamos, aparentemente, livres da censura. Espero que para sempre.

Quando o cantor Roberto Carlos entrou na justiça contra o livro “Roberto Carlos em detalhes”, de Paulo Cesar de Araújo, assinei diversos manifestos contra a censura, participei de programas de TV (num dos quais debati com o advogado de Roberto Carlos) e rádio, dei entrevista a jornais e revistas, além de escrever no meu blog e Face contra a censura. Posteriormente, Paulo Cesar de Araújo escreveu “O réu e o rei”, onde conta toda a história da biografia que escreveu e do processo que sofreu. Está tudo ali.

O pior de tudo foi a solidariedade que gente como Chico Buarque, Caetano Velho, Gilberto Gil, Djavan, Milton Nascimento deram a Roberto Carlos, aprovando o ato de censura e a queima dos exemplares da biografia do cantor. Paulo Cesar de Araújo conta, em detalhes, o que tais astros fizeram, falaram e escreveram na época – algo que nos envergonha a todos. Paulo Cesar de Araújo foi humilhado pelos “astros” acima citados.

Tenho, para mim, que há três crimes imperdoáveis: a censura, a tortura e a pedofilia, não necessariamente nessa ordem. Escrevi sobre a censura; um dia escrevo sobre a tortura e a pedofilia.