terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Mundo vasto e injusto mundo



A riqueza do planeta, se calculada pelo produto interno bruto e pelo consumo per capita de bens duráveis e domésticos, cresceu vertiginosamente no último século, mormente a partir dos anos 1950.
Os dados são realmente impressionantes. O PIB mundial era, em 1900, da ordem de dois trilhões de dólares, pulando, em 2000, para 36 trilhões, e, em 2010, para 62 trilhões. O PIB mundial per capita saltou de US$ 1.200, em 1900, para US$ 5.400, em 2000, e para US$ 11.200, em 2011. O comércio internacional atingiu, em 2000, a cifra de 7,4 trilhões de dólares, valor que significa mais de 52 mil vezes o valor de 140 milhões de dólares alcançado em 1900. Em 2009, apesar da crise, que reduziu em 10% o comércio internacional em relação a 2008, o valor das trocas e serviços atingiu algo em torno de 12,2 trilhões.
Tais incrementos não se deram de modo harmonioso e equitativo. O fosso criado entre continentes, países, regiões (inclusive dentro dos próprios países), classes e grupos sociais desenhou no planeta um cenário dominado, de um lado, pela extrema riqueza e, de outro, pela mais absoluta miséria. A julgar pelos indicadores disponíveis, elaborados por organismos internacionais idôneos, pouco mais de um quinto da população da Terra, concentrada principalmente nos sete países capitalistas mais ricos (Estados Unidos, Alemanha, Japão, França, Itália, Inglaterra e Canadá), absorvem pouco mais de 80% dos recursos e da riqueza produzida no mundo. Aos restantes habitantes do planeta - algo em torno de 75% do total - sobram cerca de 20% dos recursos e da riqueza mundial. No detalhe, tal discussão assume feições ainda mais impressionantes.
Matéria sobre o consumidor brasileiro, publicada em Carta Capital, é um exemplo dramático disso. Em cada cinco brasileiros, dois só ganham o suficiente para comprar o básico. Outros dois, nem para isso. A reportagem, que cita um estudo patrocinado pela Associação Nacional de Empresas de Pesquisa (Anep) e a Associação Brasileira dos Institutos de Pesquisas de Mercado (Abipeme), a partir dos dados do Censo Demográfico, deixou claro que 81% da população do país, ou quatro em cinco pessoas, vivem - literalmente - na corda bamba, numa espécie de cai-não-cai na miséria mais irremediável e absoluta. São 137 milhões de brasileiros pertencentes às chamadas classes C, D e E, que sobrevivem com rendas mensais brutas inferiores a R$ 1.125,00. No que se pode chamar - apelidar talvez fosse a palavra mais correta- de "capitalismo da nona maior economia do mundo", 65% da população não tem nem mesmo conta corrente, apenas 13% possui celular (contra 73,3%, na Itália) e o consumo anual per capita de leite em pó é inferior a um litro (36 litros, nos EUA).
Esta realidade, totalmente ignorada pelos donos do poder, explica em parte a dilacerante conclusão de um estudo feito recentemente pela pesquisadora Zilah Vieira Meirelles, da Fundação Oswaldo Cruz: 25% dos jovens entre 10 e 19 anos que moram em favelas no Rio de Janeiro estão envolvidos no tráfico de drogas. Cerca de 7% do total são empregados fixos e recebem salário regularmente. O restante faz pequenos serviços.
·         Um exemplo absurdo de consumo e concentração de renda e poder foi debatido por Eduardo Galeano: "Embora a maioria dos latino-americanos não tenha o direito de comprar um carro, todos têm o dever de pagar esse direito de poucos. De cada mil haitianos, apenas cinco (notem: 0,5% da população! RCA) estão motorizados, mas o Haiti dedica um terço de suas divisas (notem: um terço! RCA) à importação de veículos, peças de reposição e gasolina. Um terço dedica também El Salvador, onde o transporte público é tão desastroso e perigoso que o povo apelidou os ônibus de "ataúdes volantes".
Eduardo Galeano observou que, "comparando-se as médias do norte (países ricos. RCA) e do sul (países pobres. RCA), cada habitante do norte consome dez vezes mais energia, dezenove vezes mais alumínio, quatorze vezes mais papel e treze vezes mais ferro e aço" que o habitante do sul. De acordo com o Relatório do Desenvolvimento Humano de 1998, encomendado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), as consequências dos atuais padrões de consumo, são totalmente inaceitáveis, sob quaisquer pontos de vista (político, social, moral e ético).
"Dos quatro e meio bilhões de pessoas que vivem em países em desenvolvimento, cerca de três quintos vivem em comunidades sem saneamento básico e um terço dessas pessoas carece de água potável; um quarto não tem habitação adequada; para um quinto, o acesso a serviços de saúde modernos está fora do seu alcance; um quinto das crianças não chega a concluir os estudos básicos e o número de crianças mal nutridas atinge percentual igual. Para a maioria da população mundial em situação de grande pobreza, os deslocamentos relativos às tarefas quotidianas, incluindo a obtenção de combustível e de água, são feitos a pé".
O Relatório ainda assinalou que, apesar das elevadas taxas de crescimento verificadas no consumo nas últimas décadas, os países em desenvolvimento não estão de modo algum perto de alcançar os níveis de consumo dos países ricos. Os dados comparativos são acachapantes - e mostram que os ricos, ou seja, um quinto da população mundial:
 * Consome 45% da carne e do peixe, enquanto os mais pobres (também um quinto) consomem menos de 5%. A média de consumo de proteínas na França é de 115 gramas por dia. Em Moçambique, é de 32 gramas.
* Consome 58% da energia total, enquanto os mais pobres consomem menos de 4%.
* Possui 74% do total das linhas telefônicas, enquanto os mais pobres só têm 1,5%. Na Suécia, Suíça e nos Estados Unidos, existem mais de 600 linhas telefônicas para cada mil pessoas. No Afeganistão, no Camboja e no Chade, só existe um telefone para cada mil habitantes.
* Consome 84% do total de papel, enquanto os mais pobres consomem 1,1%. A média dos países ricos é da ordem de 78,2 toneladas de papel por cada mil pessoas, enquanto a média registrada nos países mais pobres se situa nas 0,4 toneladas por cada mil habitantes.
* Possui 87% dos veículos existentes em todo o mundo, enquanto os mais pobres têm menos de 1%. Os países ricos registram uma média de 405 automóveis por cada mil habitantes. Nos países da África Subsaariana, a média corresponde a 11 veículos por cada mil e, na Ásia Oriental e na Ásia Meridional, o valor é de cinco veículos por cada mil habitantes.
* Os trinta países que compõem a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico, OCDE, que produzem dois terços de todos os bens e serviços do mundo, consomem 29 vezes mais alumínio do que os demais países, 17 vezes mais estanho, 134 vezes mais aço, 66 vezes mais níquel, 21 vezes mais chumbo, 14 vezes mais zinco.
O modelo de consumo dos países ricos, tão ostentatório como dissipador, não é, porém, generalizável. E não pode ser visto como um parâmetro de desenvolvimento ou um objetivo a ser alcançado por todos os habitantes e países do planeta. O modelo de consumo dos países ricos é um produto de uma dada evolução histórica - e, por sua própria natureza, pressupõe e produz desigualdades permanentes, cada vez mais acentuadas.
É sempre bom acentuar que tais discrepâncias - países ricos e pobres, regiões atrasadas e desenvolvidas, classes dominantes e dominadas - são, como demonstrou o sociólogo mexicano Rodolfo Stavenhagen em estudo clássico, o resultado "de um único processo histórico". E não só isso. "As relações mútuas que mantêm entre si as regiões e os grupos 'arcaicos' e os 'modernos' ou 'capitalistas' representam o funcionamento de uma única sociedade global da qual ambos os pólos são parte integrante". (Stavenhagen, Rodolfo. Sete teses equivocadas sobre a América Latina. In: Durand, José Carlos Garcia. Sociologia do desenvolvimento. Rio de Janeiro, Zahar, 1974, p. 117). Por isso, pode-se dizer que a pobreza e a miséria constituem um subproduto específico do desenvolvimento capitalista. Desenvolvimento este que subproduziu também a riqueza.
A adoção do modelo de consumo dos países ricos pelos países pobres é, como observou Eduardo Galeano, um projeto absolutamente impossível: para que isso acontecesse seriam necessários dez planetas como este para que os países pobres pudessem consumir tanto quanto consomem os países ricos, de acordo com as conclusões do relatório Bruntland, apresentado à Comissão Mundial de Meio Ambiente e Desenvolvimento, em 1987.
Outro documento, o Relatório Planeta Vivo, divulgado em fins de 2000 pelo Fundo Mundial para a Natureza (WWF) mostrou que o uso de recursos pelos homem já excedeu, (dados de hoje, junho de 2002) em 42,5% a capacidade de renovação da biosfera. Em outras palavras: baseando-se no índice de pressão ecológica que cada habitante (pouco mais de seis bilhões de indivíduos) exerce, em média, sobre o planeta, o estudo demonstrou que, para manter os padrões de consumo atuais, sem quaisquer alterações, ou seja, com todas as suas desigualdades e deformações (!), seria necessário quase meia Terra a mais. Torna-se claro que os países subdesenvolvidos devem perder as esperanças de atingir o nível das nações avançadas. Para tanto, pela igualdade sonhada com os EUA, por exemplo, o mundo teria de produzir 75 vezes mais ferro do que agora, 100 vezes mais cobre, 200 vezes mais chumbo e 250 vezes mais estanho. Somente as jazidas de ferro conhecidas permitem especulações sobre esse fantástico incremento de produção, isso sem falar do capital necessário, incalculável.
Não há por que duvidar do que afirmam os relatórios citados. Afinal, a concentração da riqueza e do consumo é fruto dos processos civilizatórios gerais da humanidade. Favorecido por avanços científico-tecnológicos cada vez mais acelerados, o homem criou os meios que o capacita a arrancar da natureza, em maior quantidade e em prazos cada vez mais curtos, os recursos de que necessita. O aumento do índice de pressão ecológica e o esgotamento das fontes primárias passaram a conviver - perigosamente - com o homem. É o que mostraram os números dos relatórios Bruntland e WWF.
·         Não se está aqui defendendo nenhuma tese de natureza neomalthusiana. A "débâcle" ambiental do planeta se deve, sobretudo, ao exacerbado desenvolvimento do capitalismo, à sua incoercível tendência de criar hábitos e necessidades de consumo, à sua tendência natural de gerar desigualdades e deformações sociais. Veja-se, por exemplo, o exemplo do automóvel. Sabemos que os ricos do planeta - Estados Unidos, em primeiro lugar - são enfermos de "carrolatria". Os automóveis são responsáveis por grande parcela da poluição terrestre, mas todos sonham em possuir um carro. Inclusive porque os transportes coletivos, mormente nos países pobres, não funcionam.
A verdade é que, conforme notou Murli Manohar Joshi, ministro da Ciência e Tecnologia da Índia, o consumo excessivo e o desperdício são os vilões do planeta, os quais, balizados pela desigualdade extrema, põem em xeque a própria sobrevivência da humanidade. Para Joshi, há apenas um caminho para salvar a Terra: a união da política com a ciência. Se a sugestão de Joshi for correta, a primeira decisão a ser tomada, por todos os países, seria a de se adotar um novo paradigma civilizatório, inclusive pela redefinição do conceito de desenvolvimento, que passaria a levar em conta o equilíbrio dos índices de pressão ecológica e a redução progressiva da desigualdade.
O novo paradigma civilizatório deveria ter como diretriz - primeira e única! - o aumento dos padrões mínimos de consumo dos pobres (4/5 da população terrestre) e a redução do consumo (dos supérfluos, em especial) dos ricos (1/5 dos terráqueos). Esta seria, sem dúvida, a única maneira de equilibrar a disponibilidade de recursos, eliminar o desperdício e garantir o atendimento básico dos pobres do planeta.
O problema essencial, contudo, é tão antigo como a própria vida: quem irá prender o guiso no pescoço do gato? Ou seja: como convencer os 20% de consumidores efetivos a adotar outro padrão de consumo, de modo a garantir à humanidade um mínimo essencial de sobrevivência digna e a estabelecer normas de uso sustentável dos recursos disponíveis? Talvez não seja possível tão cedo se obter uma resposta para essa pergunta. Talvez o planeta tenha que passar por sérios desastres ambientais e sociais antes que os homens compreendam os perigos que nos rondam.
Como não podia deixar de ser, os Estados Unidos, o país mais rico da Terra, é o exemplo mais vivo daquele modelo de consumo e esbanjamento. Vivem nos Estados Unidos 270 milhões de habitantes (cerca de 4% da população mundial), os quais, a despeito das desigualdades sociais no interior daquele país, consomem um terço das importações mundiais, um terço da energia elétrica do planeta e gastam cinco trilhões de dólares por ano em lojas, supermercados e viagens. O PIB norte-americano soma nove trilhões de dólares (25% do PIB do planeta), e é superior à soma dos produtos internos brutos da França, Alemanha e Japão.
É óbvio que os países ricos não estão, nem um pouco, preocupados com a redução da desigualdade ou com o destino infeliz dos países e povos dos países pobres. Muito menos, portanto, estão interessados em detalhes como o aumento do consumo nesses países. Isto, aliás, ficou patente, em fins de setembro de 1995, quando autoridades de destaque (George Bush - pai -, George Shultz, Margaret Thatcher, Mikhail Gorbachev, entre outros) e megaempresários (como Ted Turner, David Packard, Washington Sycip, John Cage) reuniram-se no hotel Fairmont - o famoso "The Fairmont" -, na cidade de São Francisco, Califórnia, para discutir o futuro da humanidade. O encontro, apesar do tema tão genérico, nada tinha de acadêmico: era algo fincado na experiência dos participantes e tinha como objetivo principal a definição de estratégias empresariais. Afinal, todos os presentes eram pessoas que, por suas funções e postos, detinham enorme volume de informações - econômicas, sociais, políticas e estratégicas. Eram pessoas marcadamente pragmáticas, acostumadas a decidir com rapidez, frieza e objetivos (empresariais, é claro) bem definidos.
Após três dias de debates, os "pragmáticos do planeta" anunciaram, para surpresa dos repórteres lá presentes, que o futuro da humanidade resumia-se a um par de números - "20 por 80" - e a um estranho neologismo - "tittytainment". O que significava isso?
Segundo o porta-voz do encontro, Zbigniew Brzezinski, ex-assessor de Segurança Nacional do governo do presidente Jimmy Carter, o par de números significa que vinte por cento da população do mundo em condições de trabalhar no século XXI bastarão para manter o ritmo da economia mundial. Brzezinski ainda explicou que aqueles 20% participariam ativamente da vida, do lazer e do consumo - seja qual for o país. "Mão-de-obra adicional não será necessária", sentenciou, por fim, o magnata Washington Sycip na coletiva que se seguiu à reunião.
Em tom didático, diante de uma plateia de jornalistas de todas as partes do mundo, Brzezinski explicou ainda que "tittytainment" era um neologismo formado pelas palavras "entertainment" (diversão, entretenimento, recreação) e "tits" (gíria americana para seios ou tetas). "Tittytainment" seria assim uma mistura de diversão anestesiante e comida no limite, as únicas compensações possíveis para a vasta legião de excluídos, desempregados, infelizes e frustrados da Terra. Note-se: diversão anestesiante e alimentação no limite seria, assim, a versão pós-moderna e neoliberal do panem et circenses romano.
Indagado sobre quem pagaria a conta ou seria responsável pelo "entertainment" da população supérflua do planeta (4/5 dos habitantes do mundo), o porta-voz Brzezinski fez um gesto vago. Estava fora de questão, alertou, o engajamento social das empresas privadas, já que elas estavam por demais assoberbadas pela concorrência e pelas exigências do mercado globalizado. Outras organizações, concluiu sem dizer que organizações seriam essas, que cuidassem dos desvalidos e dos desempregados.
·         Como observaram Hans-Peter Martin & Harald Schumann, "o mundo 20 por 80, a sociedade do um quinto, como os visionários do Fairmont Hotel pintaram o século 21, é muito coerente com a lógica técnica e econômica que guia os governos e dirigentes empresariais rumo à integração global. Contudo, a corrida mundial por máxima eficiência e mínimos salários está abrindo as portas do poder à irracionalidade. Não são os realmente miseráveis que se rebelam. Uma força política tremendamente explosiva provém do medo do rebaixamento social que agora se manifesta. Não é a pobreza que ameaça a democracia, mas sim o pavor dela". As cenas de desespero - quebra-quebras, passeatas, protestos diante de bancos e outras formas de reação - dos argentinos, principalmente da classe média argentina, que padecem de um processo acelerado e doloroso de empobrecimento, são uma trágica confirmação das palavras de Martin e Schumann.
Retomando: o principal - a rigor, o único - objetivo dos países ricos, especialmente o dos Estados Unidos, é garantir o ritmo da acumulação de riqueza e ampliar ou, quando muito, manter os seus próprios padrões de consumo, independentemente do que isso possa representar para a segurança do planeta ou para a sobrevivência do resto da humanidade - isto é, dos habitantes dos países pobres e dos pobres dos países ricos. A economia política dos países ricos e das suas corporações, a rigor, não necessita dos seis bilhões de habitantes da Terra. Bastam-lhes 1,2 bilhão de produtores e consumidores para salvaguardar o ritmo e a perenidade do regime global de acumulação. No Brasil, como foi visto, um quinto da população mantém em funcionamento a nona economia do mundo.
Bem verdade que os países ricos dependem dos recursos naturais dos países pobres, razão pela qual o desinteresse dos ricos não significa indiferença pelos pobres, daí as políticas compensatórias e os vários tipos de ajuda e assistência fornecidos pelos ricos aos pobres. O desinteresse dos ricos significa, de fato, o estabelecimento de uma ordem mundial de dominação silenciosa (às vezes, é claro, contra os recalcitrantes a guerra - a dominação pela força - torna-se inevitável), de modo a garantir, em detrimento dos países pobres, os ganhos e vantagens dos países ricos. Estes, cabe repetir, são carentes de recursos naturais não-renováveis e daqueles recursos renováveis somente possíveis nos trópicos. Tais carências são conhecidas e reconhecidas - e ninguém menos que o ex-secretário de Estado dos Estados Unidos, Henry Kissinger, soube expressá-las com absoluta exatidão: "Os países industrializados não poderão viver de maneira como existiram até hoje se não tiverem à sua disposição os recursos não-renováveis do planeta. Para isso terão de montar sistemas mais requintados e eficientes de pressões e constrangimentos, que garantam a consecução de seus objetivos".
Como se vê, o comentário de Henry Kissinger prima pela sinceridade e pela clareza políticas. Representa, no fundo, um juízo crítico bem formulado, certamente apoiado em informações precisas e extensas, que só a elite do poder (a expressão é de C. Wright Mills) tem acesso e meios de manipular.
Henry Kissinger sabe, sem dúvida, que os Estados Unidos - e, por extensão, os países ricos - dependem dos recursos naturais que estão, em grande parte, nos países pobres ou, provavelmente, em áreas ainda não passíveis, por razões políticas ou tecnológicas, de exploração sistemática, como o Polo Norte, a Antártida, as vastidões geladas da Sibéria e do Canadá, o Saara, o fundo dos oceanos. Todos perceberam a extensão do alerta do ex-secretário de Estado dos EUA - e sabem exatamente o que a advertência significa.
Ampliar ou, mesmo, manter os atuais padrões de riqueza e de consumo dos países ricos significa, em primeiro lugar, intensificar a exploração dos recursos naturais nas áreas tradicionais, muitas delas em vias de esgotamento, devido justamente à exploração intensiva predatória e irracional. Uma alternativa seria a de localizar, entre as disponíveis, áreas de exploração novas, promissoras, praticamente vazias, potencialmente ricas, tecnologicamente viáveis, politicamente disponíveis. Que áreas seriam essas?
Abriram-se os mapas nos centros decisórios do planeta.
E, mais uma vez, os olhos dos países ricos pousaram naquela vasta e rica floresta equatorial da América do Sul. E enxergaram, nos rios, nos igarapés e igapós, nas terras firmes, no solo e subsolo, no material orgânico, na vida biológica, nas copas das árvores da Amazônia, riquezas imensas, abandonadas e esquecidas por tantos governos que deveriam olhá-la como uma região estratégica ao próprio esforço de desenvolvimento do Brasil. Dito de outra forma: o Brasil não sabe o que fazer com a Amazônia.
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"Meu caro amigo"


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