O revolucionário conservador
Os grandes temas tratados por Manoel Bomfim, com variações de forma, intensidade ou conteúdo, permanecem, sem solução, no cotidiano brasileiro. Um desses temas, pouco salientado nos estudos sobre a obra do sergipano, tem evidente atualidade: o caráter intrinsecamente conservador dos políticos brasileiros e latino-americanos. Mesmo os mais ousados entre os homens públicos (quando estão na oposição) tornam-se, no poder, tão conservadores como os conservadores de ofício.
O perfil que Bomfim traça dos políticos é atualíssimo: todos são progressistas ou, mesmo, revolucionários, quando estão fora do poder; no poder, o sentimento conservador os domina, seja por pura ambição, tendência instintiva ou jogo de interesses. Foi o que aconteceu com o chamado Partido dos Trabalhadores.
Bomfim extraiu do conto O alienista, de Machado de Assis, um exemplo de como age o “revolucionário conservador”. Diante das violências do médico Simão Bacamarte, o povo de Itaguaí se revolta sob a liderança de Porfírio das Neves, que assume o governo da vila. “O nosso revolucionário depõe as autoridades, faz-se chefe do governo local, vai ao médico, arranca-lhe as chaves do hospício-prisão; mas, com grande espanto das gentes, no momento de franquear as portas, faz um discurso sobre os interesses conservadores da sociedade e o perigo das transições bruscas, e pede o respeito às coisas existentes”.
Quando todos supunham que Porfírio iria prender Bacamarte e fechar o hospício-prisão, o líder da revolta assume um discurso conciliador, pois “a ordem, minha gente, é a base do governo”. Em nome da tradição e “dos perigos inerentes às transições bruscas”, Simão Bacamarte e o hospício são reintegrados à nova ordem por proposta do ex-revolucionário Porfírio das Neves. Antes em campos opostos, Bacamarte e Porfírio tornam-se aliados. Tal qual os nossos inefáveis Lula e Sarney.
A análise do caráter dos dirigentes políticos nos ensina que, na véspera, todos são radicais ou reformistas, querem mudanças; no dia seguinte, as vozes se amansam e passam a defender a ordem que antes denunciavam.
Como escreveu Bomfim, em 1905, esta é a nossa rotina: conciliar e conservar. Uma rotina que perdura, até hoje.
Y así pasan los días
1 – Aqui, nesse Papo de Amigos, o Velho Professor do Penedo já falou sobre a tragédia do Sudão. Semana passado, por coincidência o astro George Clooney participou de uma manifestação em Washington contra a matança no país africano. Foi preso. A Rede Globo noticiou o fato, mas sem revelar a causa da prisão, ou seja, o protesto que Clooney fazia contra o morticínio no Sudão. A atitude de Clooney foi perfeita. Pena que os astros e estrelas do Brasil não tenham o mesmo comportamento diante das mazelas do nosso mundo. Agora, a Rede Globo é isso: entre o morticínio no Sudão e a notícia da prisão de Clooney, preferiu a segunda, sem mostrar o que ocorre no Sudão.
2 – O episódio da morte de 16 civis no Afeganistão, assassinados por um soldado não foi uma exceção. Em janeiro, um vídeo mostrou soldados americanos urinando em corpos de militantes do Taliban. Em fevereiro, soldados americanos queimaram exemplares do Alcorão. Mais isto é tradicional: durante a Guerra do Vietnam soldados americanos aprontaram. Duvidam? Leiam sobre a guerra ou vejam o filme “Platoon”.
3 – O desenvolvimento brasileiro, patrocinado pelo PT, foi um retrocesso ao nosso passado colonial. Deu no O Estado de S. Paulo: “Só 6 produtos representam 47% do que o Brasil exporta”. Seis matérias-primas: minério de ferro, soja, carne, açúcar, petróleo bruto e café. Um dia, “tia” Dilma ainda vai anunciar que nos tornamos, graças ao seu governo, um exportador de pau-brasil. E vai informar que Mem de Sá foi um dos fundadores do glorioso PT.
4 – A transposição do Rio São Francisco, assunto sobre o qual o Velho Professor do Penedo já escreveu tantas vezes, está com as obras do trecho de Salgueiro paradas. Aliás, como informou Luiz Carlos Azedo (Correio Braziliense, 9 de março de 2012), o balanço da segunda etapa do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC 2) mostrou que o custo saltou de R$ 4,5 bilhões para R$ 8,18 bilhões. Um aumento de 82%. Tem muita gente ficando rica...
5 – O Pastor Crivella, nosso ministro da pesca que não sabe prender uma minhoca no anzol, vai nomear o brigadeiro Átila Maia, filiado ao PRB, como secretário executiva (vice-ministro) da pasta. Um pastor e um brigadeiro. Não pode dar certo.
6 – O jornalista Luiz Carlos Azedo informou (Correio Braziliense, 6 de março de 2012) que o choro da “tia” Dilma no episódio do afastamento de Luiz Sérgio do Ministério da Pesca para dar lugar ao Pastor Marcelo Crivella não foi motivado pelo afeto. “Tia” Dilma chorou porque fez a mudança contrariada, a pedido de Lula. O Velho Professor do Penedo já defendeu nesse Papo de Amigos que “tia” Dilma chorou de vergonha. Mais uma vez: bem feito.
7 – Quando eu estava pesquisando para escrever “O rebelde esquecido: tempo, vida e obra de Manoel Bomfim”, encontrei histórias (reais) paralelas incríveis. Sentem-se, fiquem à vontade e escutem.
8 - Em 8 de maio de 1915, o poeta Manuel Batista Cepellos, autor de “A derrubada” (1896), “Os bandeirantes” (1906) e “Vaidades” (1908), suicidou-se por razões que só mais tarde foram conhecidas.
9 – Cepellos era natural de Cotia, interior de São Paulo. Foi protegido do senador Francisco de Assis Peixoto Gomide, que, entre outras ajudas, financiou os seus estudos na capital paulista.
10 – A convivência familiar levou o poeta Cepellos a apaixonar-se pela filha do seu benfeitor. O casamento foi marcado, apesar da incompreensível e estranha oposição de Peixoto Gomide.
11 – Um dia, em meio a uma explosão de cólera, e totalmente fora de si, o senador mata a própria filha e a seguir explode os miolos com um tiro, revelando antes que os noivos eram irmãos!
12 – Chocado, Cepellos muda-se para o Rio de Janeiro, onde torna-se um alcoolatra e vítima de crises continuadas e profundas depressão. Tudo aquilo, porém, foi demais para ele, que acabou também por se matar, atirando-se do alto de uma pedreira. Cepellos tinha ao morrer 43 anos. Uma história de arrepiar. Como diria Nelson Rodrigues, um episódio da vida como ela é.
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Walter Alfaiate
Hoje, é dia de Walter Alfaiata, a quem conheci em Brasília, quando ele aqui veio para fazer um show no Feitiço Mineiro. Isso foi em 2009. No ano seguinte, ele faleceu. No Papo de Amigos, Alfaiate canta “Botafogo, chão de estrelas”, de Paulinho da Viola e Aldir Blanc. Na música, Alfaiate fala da Rua Marques de Abrantes, onde o Velho Professor do Penedo passou a infância.
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