Jornal do Velhote do Penedo
Quarta-feira, 13 de fevereiro de 2014 – Nº 21
Um jornal a serviço de ideias desabusadas
Vivemos uma democracia de fachada, onde até a FIFA dá pitaco!
O
Brasil, como me disse há dezenas de anos, o grande mestre Guerreiro Ramos, é um
país surrealista e inconfundível. Tem tudo para ser uma nação próspera, rica e
politicamente sadia, mas optou pelo atraso político, educacional, cultural e
econômico e pela enfermidade social. O Brasil sofre de hanseníase.
Sobrevivemos,
hoje, de um novo ciclo econômico. Tivemos o do pau-brasil, o do açúcar, o da
borracha (que levou prosperidade à região norte), o do ouro, e por aí vai. Hoje,
vivemos o ciclo da soja e do minério de ferro (78% das nossas exportações).
Se antes
mandávamos o açúcar para Portugal e a borracha para os Estados Unidos e Inglaterra,
hoje mandamos a soja e o minério de ferro para a China. Naquele tempo, açúcar,
borracha e café eram matérias-primas; hoje, soja e minério de ferro são
commodities. Inegável que ficamos mais sofisticados.
Optamos
pela dependência mais escancarada, na mesma proporção em que somos campeões
mundiais de analfabetismo de adultos, de violência, de corrupção e de doenças
que países menores e com menos recursos já erradicaram. Não produzimos um só
prêmio Nobel, enquanto a Argentina produziu três, um no campo da física. Ser brasileiro
não é fácil. Mas, falemos dos dias atuais.
Por
artes e ofícios do jogo político e dos interesses mais mesquinhos e antipovo,
fomos escolhidos como sede da Copa do Mundo, versão 2014. Não tínhamos
condições nenhuma de realizar a Copa, mas a vaidade de alguns, a prepotência de
outros e os interesses inconfessáveis de muitos predominaram e, assim, assumimos
o compromisso. No fundo, esses alguns,
outros e muitos tinham uma certeza: o brasileiro, que só é patriota no futebol,
vai se esbaldar com a Copa, pouco se importando com os custos e os problemas
que advirão. Nós, de nossa parte, vamos faturar, em todos os sentidos possíveis,
sobretudo o dos bolsos e o das contas correntes no exterior.
A
FIFA é um poder movido a dinheiro e corrupção, coisas que ela alastra por onde
passa, mormente em países como o Brasil, onde a ladroagem campeia. Duvidam? Têm
dúvida? Acham que exagero? Leiam, então, o livro (há tradução no Brasil) “Jogo
sujo”, de Andrew Jennings. Jennings é repórter investigativo há mais de trinta
anos. Trabalhou nos jornais britânicos The Sunday Times e Daily Mail, entre
outros jornais. Jennings esteve recentemente no Brasil. Deu uma longa entrevista
ao ESPN, contou tudo, em detalhes. A Rede Globo e a Globonews o ignoraram, mas
as duas têm interesse direto na Copa e agem, hoje, no Brasil, como delegados da
FIFA. Tudo muito estranho e suspeito.
Enquanto
construíamos estádios suntuosos, o povo brasileiro vivia a sua triste rotina:
baixos salários, inflação em alta, juros estratosféricos, impostos, transportes
urbanos de dar vergonha, hospitais de dar nojo, escolas ruins, segurança
péssima.
Os
estádios foram ficando prontos – e, pior ainda, tiveram início a divulgação dos
seus custos. O de Brasília, por exemplo, custou a bagatela de 1 bilhão e 600
milhões! O de Natal, onde os hospitais públicos foram enquadrados na condição
de “calamidade pública”, custou mais de 600 milhões. O do Paraná, que ainda não
está concluído, custará, segundo as autoridades, 650 milhões. Não preciso
continuar: são ou serão 12 estádios. O que fazer com eles depois da Copa?
Em
junho, milhões de manifestantes foram às ruas. Pediam escolas, hospitais,
segurança, transportes com a qualidade dos estádios exigidos pela FIFA. No
início, tudo bem: Renan Soares, o Cabeleira, fez um discurso lindinho no Senado,
prometendo mundos e fundos, inclusive tarifa zero. “Tia” Dilma disse que faria
o dia, inclusive um plebiscito e uma consulta ao povo, mas até agora não fez nada:
está mais interessada em inaugurar estádios e fazer composição eleitoral com
filhotes da ditadura. O Congresso, ou melhor, os partidos políticos estão mais
interessados em cargos, na distribuição de cargos, no fatiamento do Estado, no “quero
o meu”. Os manifestantes? Ora, os manifestantes: pau neles!
As
Polícias Militares entraram em cena, no melhor estilo ditadura militar: batem
primeiro, atiram a primeira bomba, dão o primeiro tiro e depois acusam os
manifestantes.
As
polícias militarizadas é coisa da ditadura, que a democracia nossa, administrada
por filhotes da ditadura e políticos traíras e corruptos, jamais farão o que devem:
extingui-las. Não. Vão mais é fortalecê-las em nome da defesa do patrimônio
público e privado. Gente que rouba descaradamente o patrimônio e o dinheiro
público tornou-se, de repente, não mais que de repente, defensor da coisa pública.
De
violência em violência, chegamos aos três tiros que um estudante recebeu de
quatro meganhas que o cercaram (a mídia divulgou o nome de quem deu os três
tiros no jovem?) e ao explosivo que matou o cinegrafista Salvador Andrade, uma
tristeza que, muitos inescrupulosos, estão transformando num carnaval
ideológico.
Hoje,
sabemos que o senador Romero Jucá, aquele que apoia sempre quem está no poder,
propôs uma lei, que eleva à condição de terrorismo tudo aquilo que “perturba” a
ordem pública. Não define terrorismo, nem ato terrorismo – isto fica por conta
da polícia e da justiça. Reparem bem o que disse Jucá a um jornalista do
Correio Braziliense:
“O
modelo de segurança que temos que ter para combater vandalismo tem que
funcionar para a Copa e para depois do Mundial de futebol. Vamos votar projeto
de lei duro, que vai punir, coibir e proteger a sociedade”.
É
óbvio que o objetivo da lei é, de um lado, punir quem ousar protestar contra as
patifarias que se pratica no país (mesmo os protestos sem violência) e, de outro,
mais essencial que o anterior, evitar que haja manifestações. Tal como o AI-5,
a lei proposta de Jucá quer a paz dos pântanos. Para gente como Sarney, Jucá,
Barbalho, a maioria do Congresso Nacional, o povo é apenas um sujeito que vota –
com que direito ele, o povo, vai querer mais que isso?
A
Copa transformou-se numa bofetada na cara do povão (excluído dos estádios e dos
jogos em razão dos elevados preços dos ingressos). Uma comparação: a bolsa
família, por exemplo, vale 70 reais por família; o mais barato ingresso para o
jogo de abertura da Copa é 160 reais por pessoa. O povo pagou os estádios com
seus impostos, mas foram excluídos dos estádios.
Explica
isso, “tia” Dilma!