Tristeza extrema
A
morte do cinegrafista Salvador Andrade foi uma tristeza e uma lástima em todos
os sentidos.
A
morte de um ser humano, independente de sua profissão, é sempre um fato triste,
inconsolável, chocante - tanto para os seus familiares como para os seus
amigos. É necessário e imprescindível que a polícia identifique o assassino,
desnude seus antecedentes e o leve às barras dos tribunais. A polícia existe
para isso.
Todos
nós, que vivemos numa sociedade arbitrária e violenta, onde, conforme vaticinou
Hobbes, todos lutam contra todos, sonhamos (temos esse direito) com o dia em
que os culpados sejam punidos severamente pelos crimes que cometerem, a polícia
cumpra o seu dever de defender os cidadãos e nós outros possamos andar pelas
ruas em paz e sem medo. Cá, na capital da República, o crime, os assaltos e os
assassinatos campeiam livremente. Enquanto a política pratica uma insensata “operação
tartaruga”, o governador nada diz, nada vê, nada ouve, como os macaquinhos da
lenda.
O
episódio da morte de Salvador Andrade foi traumático em todos os sentidos.
As
primeiras manifestações em junho e julho foram relativamente pacíficas, embora
as polícias militares de São Paulo e do Rio de Janeiro tenham baixado o pau,
sem dó nem piedade, nos manifestantes.
A
capa da revista ISTOÉ trouxe, inclusive, uma foto em que um meganha de dois metros
de altura por dois de largura agredia, pelas costas, uma jovem universitária.
Escrevi a respeito à “tia” Dilma, pedindo que o milico fosse identificado e
punido. Recebi uma resposta que me deu náuseas: ela agradecia minha
contribuição (qual?) – e me informava, como se eu fosse um idiota qualquer, que
continuaria a “zelar pela tranquilidade do povo brasileiro”.
A
própria revista ISTOÉ, na semana seguinte, localizou a jovem, mas não pode
identificar o meganha porque, segundo a PM de São Paulo, isso não fazia parte
das normas.
Mas,
como eu dizia, as primeiras manifestações foram pacíficas, mas as polícias do
Rio e de São Paulo baixaram o cajado nos manifestantes. Pudera: o que esperar
dos governantes daqueles estados?
A
partir daí, a violência cresceu – e a cada resposta às violências das PMs, a
Rede Globo e a GloboNews cunharam a expressão “vândalos”, que tinha três
objetivos: (1) estigmatizar os manifestantes; (2) afastar, pelo medo, as
pessoas das ruas; (3) jogar a opinião pública contra os manifestantes.
A
Rede Globo e a GloboNews só aprovam manifestações na Ucrânia, na Turquia, na
China, nos países árabes. Lá os manifestantes são chamados de manifestantes. Na
América Latina e, especialmente, no Brasil – jamais! Aqui, os manifestantes são
chamados de vândalos.
A
Rede Globo e a GloboNews conseguiram o que queriam. Mas esta “vitória” da Rede
Globo e da GloboNews teve um preço: o aumento generalizado, e de lado a lado,
da violência, cuja culminância foi a morte do cinegrafista Salvador Andrade.
A
morte de Salvador Andrade deve ser repudiada por todos os homens de bem.
O
terrível é que todos querem tirar uma “casquinha” da morte de um cidadão, pai
de família, trabalhador. Salvador Andrade foi triplamente vítima: vítima daqueles
que açularam a violência; vítima de um assassino travestido de manifestante;
vítima agora daqueles que transformaram sua morte num instrumento de pregação
político-ideológica.
O
jornal O Globo, mais que depressa, tentou vincular o assassino ao deputado Marcelo
Freixo, do Psol. Freixo é um dos mais decentes políticos do Brasil, enfrentou
as chamadas milícias e vem denunciando e lutando contra as arbitrariedades
regidas pelo governador Sérgio Cabral e pelo prefeito Eduardo Paes. A Rede
Globo e a GloboNews em todos os seus noticiários ataca os manifestantes em
geral, chama-os, como de hábito, de “vândalos” – e agora de “assassinos”,
generalizando um episódio lamentável, triste, mas único e específico.
Vários
jornais (e não só O Globo, a Rede Globo e a GloboNews) veem no episódio o que
eles chamam de “atentado à liberdade de imprensa”, o que é mera manipulação. O
cinegrafista foi assassinado, atingido por uma bomba, lançada por um cidadão
que precisa ser identificado, preso e condenado. Este cidadão não visava
atingir a liberdade, mas cometer uma violência, que, em certo sentido, foi fomentada
pelos jornais e pelos canais de televisão.
A Rede
Globo investiu muito dinheiro na Copa. Pretende ganhar muito mais com a sua
realização. Os protestos contra a Copa são inaceitáveis: a Rede Globo nunca
disse nada contra o fato de que os gastos em estádios são intoleráveis para uma
população que não possui hospitais decentes, escolas dignas e meios de
transportes humanos, mormente para quem fica horas dentro de ônibus e trens infectos
e desumanos.
Para
terminar: que coisa grotesca foi a conclusão da entrevista coletiva do Felipão!
Seguindo um script que lhe foi imposto pela Rede Globo, quis dizer algumas
palavras sobre a morte de Salvador Andrade. Além de gaguejar, Felipão
simplesmente esqueceu o nome do cinegrafista. Aquele seu “como é mesmo o nome?”
foi outra agressão à memória de um inocente.
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