Censura, tortura e pedofilia
Eu era,
nos anos 1950, um jovem atrevido e estudava no Souza Aguiar, colégio estadual
da melhor qualidade, onde tínhamos professores como Paulo Ronái, Orlando Valverde,
Leodegário A. Azevedo Filho, Almir Câmara de Matos Peixoto, Edmundo Moniz, Bella
Jozef, entre muitos outros.
O Souza
Aguiar ficava na Rua Gomes Freire, na Lapa, bairro boêmio do Rio. Tínhamos boas
vizinhanças: o velho e saudoso Correio da Manhã, o teatro República (onde vi,
pela primeira vez, as gloriosas coxas da vedete Nélia Paula), botecos, o Bar
Brasil e diversas – digamos – casas de tolerância.
O Souza
Aguiar era, como todos os colégios da época, muito cioso das regras
disciplinares, mas o ensino e a qualidade dos professores eram da melhor qualidade.
Tínhamos,
os alunos do Souza Aguiar, nessa época, um jornalzinho mensal, no qual
publiquei os meus primeiros textos. Houve, um mês, contudo, que o meu artigo
não foi publicado – tinha sido censurado pela direção do colégio. Não me lembro
do artigo (era um conto), mas, segundo me lembro, a censura abrangia o tema
(era uma história que se passava num rendez-vous) e o uso de palavras como prostituta,
caftina, sexo, entre outras.
Protestei
o quanto pude, fui à direção, conversei com professores, mas não convenci
ninguém dos bons propósitos do meu conto.
Desde
então criei absoluto desprezo pela censura, pelos censores, por qualquer forma
de restrição coercitiva à liberdade de expressão.
Recentemente,
houve uma tentativa de abertura de processo contra um dos meus livros (o que
talvez mais tenha sido vendido, pois o que ganhei com ele me financiou uma
viagem à Europa). Estávamos – eu e a editora – nos defendendo quando o STF, por
unanimidade, estabeleceu que o “cala a boca já morreu”. Estamos, aparentemente,
livres da censura. Espero que para sempre.
Quando
o cantor Roberto Carlos entrou na justiça contra o livro “Roberto Carlos em
detalhes”, de Paulo Cesar de Araújo, assinei diversos manifestos contra a
censura, participei de programas de TV (num dos quais debati com o advogado de Roberto
Carlos) e rádio, dei entrevista a jornais e revistas, além de escrever no meu blog
e Face contra a censura. Posteriormente, Paulo Cesar de Araújo escreveu “O réu
e o rei”, onde conta toda a história da biografia que escreveu e do processo
que sofreu. Está tudo ali.
O pior
de tudo foi a solidariedade que gente como Chico Buarque, Caetano Velho,
Gilberto Gil, Djavan, Milton Nascimento deram a Roberto Carlos, aprovando o ato
de censura e a queima dos exemplares da biografia do cantor. Paulo Cesar de
Araújo conta, em detalhes, o que tais astros fizeram, falaram e escreveram na
época – algo que nos envergonha a todos. Paulo Cesar de Araújo foi humilhado
pelos “astros” acima citados.
Tenho,
para mim, que há três crimes imperdoáveis: a censura, a tortura e a pedofilia,
não necessariamente nessa ordem. Escrevi sobre a censura; um dia escrevo sobre
a tortura e a pedofilia.