O
Brasil é um país carente de pudor.
A carta
aberta de advogados contra a Operação Lava Jato é digna de estudos e reflexões
pelo que ela tem insensata.
Acostumados
a cobrar milhões para defender gatunos que roubaram bilhões, advogados denunciaram
o que eles rotularam de métodos autoritários do Lava Jato. Métodos, segundo
eles, nunca vistos no Brasil, nem mesmo durante a ditadura. É moda, hoje,
desqualificar alguma coisa comparando-a com o que era corriqueiro na ditadura.
Os
argumentos dos advogados coincidem, em parte, com o que disse o PT, partido que
traiu as suas origens, transformando-se num partido cuja ética pode ser medida pelos
cifrões que recebe por baixo dos panos. Coincidência?
Quando
o Mensalão prendeu diversas lideranças políticas, o autoritário da época,
segundo o PT, era o juiz Joaquim Barbosa. Bem, o caso do Joaquim Barbosa tinha
outro componente embutido: o racismo à brasileira, insidioso, mascarado, negado,
sutil, mas sempre evidente e praticado.
Na
época, recebi uma mensagem de um jornalista aqui de Brasília que, no mesmo
texto, escreveu três vezes que Joaquim fora o “primeiro negro” a ser indicado
para o STF – e insinuava que ele deveria ser agradecido ao Lula, que o indicou.
A indicação de Barbosa seria uma espécie de dádiva concedida pelo Brahma. Ora,
se Lula indicou Barbosa por ser ele um afrodescendente, independentemente da
sua qualificação, o presidente da República foi racista, demagogo e errou na
sua função de presidente.
Não respondi
a mensagem, mas o jornalista cometeu, num só parágrafo, um erro histórico e um
crime.
O erro
histórico foi o de afirmar que Joaquim Barbosa foi o primeiro afrodescendente a
vestir a toga do STF. Besteira. Antes dele, dois outros afrodescendentes
pertenceram ao Supremo: Pedro Lessa (1907-1921) e Hermenegildo de Barros
(1919-1937). O jornalista não cometeria tal erro se tivesse consultado a bem documentada
“Enciclopédia brasileira da diáspora africana”, de Nei Lopes.
O crime
foi bem mais sério. Certa ocasião, Abdias do Nascimento, um ícone do movimento
negro brasileiro, me disse que toda vez que alguém cita a cor da pele de um
sujeito como referência (para o bem ou para o mal), na realidade está fazendo
uma referência racista. Lula, por exemplo, indicou Ricardo Lewandovski para o
STF. Por que o jornalista não fez uma referência do tipo “ministro branco e
louro indicado por Lula”? O jornalista, que, por sinal, é branco, lamentou que
Barbosa não foi agradecido ao PT – e, no melhor estilo racista, sugeriu que o afrodescendente
ministro “sujou na saída”. Ou, o que é pior, não beijou a mão do “sinhozinho
Lula”.
A
verdade é a seguinte: no Brasil, poucos aceitam que um ministro afrodescendente
acuse, condene e prenda políticos brancos e louros. Joaquim Barbosa foi
demonizado porque era afrodescendente – e muitos militantes petistas, jornalistas
e intelectuais têm, dentro deles, um viés racista do qual eles nunca se
libertaram, mas procuram disfarçar com belos discursos. Daí, a guerra contra o
ministro Joaquim Barbosa.
Agora,
as baterias se voltam contra a Operação Lava Jato, acusando-a de ser um
tribunal autoritário. Na realidade, os signatários da carta aberta - donos,
sócios ou associados de bancas que se tornaram poderosas defendendo notórios
larápios do dinheiro público -, sabem que a fonte dos seus milionários ganhos
está sendo desnudada, posta a nu pela Lava Jato. Compreende-se, assim, a carta
aberta dos advogados.
A
verdade dói. Os advogados ficaram ricos e poderosos porque receberam raspas do
dinheirão que empresários e políticos inescrupulosos roubaram ou sonegaram. Se
um empresário estarra 300 milhões e paga 30 milhões a uma banca para
defendê-lo, temos aí uma relação, no mínimo, incestuosa.
Os
empresários não merecem defesa. Merecem. Nós é que não merecemos ser premiados
com uma carta aberta contra uma Operação que pretende enfrentar a corrupção no
Brasil.
O
Brasil é um país com déficit de pudor e caráter. É a conclusão que cheguei ao
ler a carta aberta dos sábios.
Nenhum comentário:
Postar um comentário