Como
dançarina, Mata Hari obteve enorme sucesso nos teatros e music-halls europeus.
Recebia cachês astronômicos, que pulverizava em jóias e roupas (renovava seu
guarda-roupa com rapidez estonteante). Apaixonou-se muitas vezes e provocou
paixões avassaladoras em homens poderosos e ricos. Talvez tenha sido a mulher
mais desejada de sua época, o que a fez atrair rancores, ciúmes e ódios.
Mulheres a odiavam; homens a veneravam.
Mata Hari
viveu sobre o fio da navalha, mas nunca se deu conta disso – ou, se deu, fez
que não sabia. Era uma mulher sem preconceitos, que ousou desafiar o moralismo
e os costumes provincianos dos primeiros anos do século XX – e pagou muito caro
por isso. Devido ao seu trânsito fácil pelos gabinetes, quartos e alcovas de
figurões dos mais diferentes governos e das mais variadas estaturas econômicas
(banqueiros, industriais), Mata Hari foi sondada por diversos países. Todos a desejavam
como espiã, pois, os homens quando elogiados por seu desempenho na cama,
tornam-se loquazes e manipuláveis.
A verdade é
que nunca ficou provada a culpa de Mata Hari. Contra ela havia apenas um cabograma
enviado à espionagem alemã (e interceptado pela contraespionagem francesa),
cujo texto era curto e dúbio – e que afirmava que a agente H.21 (que seria o
codinome de Mata Hari) “nada produziu de sério depois que a guerra começou”. A
vida, peripécias e morte de Mata Hari – não se trata de uma biografia – foram
contadas por Paulo Coelho em seu novo romance, “A espiã”.
Considero
Paulo Coelho um fenômeno – e isso não é um elogio, mas uma contestação. Ele já
vendeu mais de 210 milhões de livros em mais de 170 países e 81 idiomas. Não
sei se há equivalente no mundo. No Brasil, ele é ignorado pela chamada
inteligência, que o considera um escritor menor. Tudo bem: menor ou não, Paulo
Coelho é um escritor: tem uma produção, vive do que escreve, nunca se envolveu
em polêmicas inúteis e defende a liberdade de expressão. Jamais processou alguém
pelos ataques que recebeu, e eles foram muitos. No episódio em que Roberto Carlos
processou Paulo César de Araújo, autor de “Roberto Carlos, em detalhes”, Paulo
Coelho não se omitiu: defendeu, em artigos, o direito do jornalista, condenando
a censura – que, por sinal, era defendida por gente como Chico Buarque, Caetano
Veloso, Gilberto Gil, Milton Nascimento, Djavan, entre outros “democratas”. O
livro do Paulo César de Araújo foi recolhido das livrarias – e queimado por
ordem de Roberto Carlos. Num país em que talento superlativo nem sempre anda a
par com a grandeza moral, vulgo
dignidade, o comportamento de Paulo Coelho no episódio deve ser destacado. A
inteligência brasileira, a mesma que não reconhece Paulo Coelho, nada disse
contra o arbítrio que vitimou Paulo César de Andrade, nem sobre a atitude do
autor de “Brida”. (Sobre o episódio, sugiro a leitura de “O réu e o rei”, de
Paulo César de Araújo, que narra os meandros do episódio).
“A espiã”, de
Paulo Coelho, enfim, me agradou – não me pejo de afirmar. Claro, Paulo Coelho
não é um escritor da dimensão de Guimarães Rosa, Érico Veríssimo, José Lins do
Rego, Rubem Fonseca, Graciliano Ramos e Machado de Assis, para citar os meus
preferidos. Mas é competente, domina as técnicas da narrativa – e, sobretudo,
não busca uma falsa sofisticação: escreve com clareza e suas frases têm
sujeito, verbo e predicado. Não derrapa em silogismos e evita os conectivos. Seu
texto lembra redação de estudante aplicado e estudioso: é claro e correto. É sóbrio.
Não abusa de figuras de linguagem.
Um amigo meu
me afirmou que “O alquimista” é uma droga. Não sei – não o li. Nem pretendo. Li
“A espiã” movido pela curiosidade: eu nunca lera Paulo Coelho e nada sabia
sobre a saga de Mata Hari. De qualquer forma, aconselhei o meu amigo a ler “A
espiã”. Ele pediu o meu exemplar emprestado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário