sábado, 3 de junho de 2017

Delação premiada, tortura y otras cositas más!


Vou escrever hoje sobre a delação premiada.

De início, devo dizer que toda delação é premiada. Quem delata sempre visa a ganhar alguma coisa. A expressão “delação premiada” é redundância. E mais: delação é delação – ou seja, é dedurismo, como dizíamos na ditadura. Na Bíblia, Judas foi um dedo-duro, tal como foram, na história brasileira, Calabar e Joaquim Silvério dos Reis. Na minha adolescência, quando estudava no Colégio Sousa Aguiar, peguei três dias de suspensão, dada pelo vice-diretor, Sylvio Guadagny, porque não entreguei os dois colegas que tinham desenhado uma mulher de pernas abertas na parede do banheiro da escola. Como eu me recusei a denunciar, fui punido. Se eu denunciasse, não seria suspenso: era o meu prêmio.

Reitero delação é caguetagem (como se dizia nos anos 1950) – e toda caguetagem é premiada. Quando a mãe, com o chinelo na mão, pergunta a um dos filhos quem fez a travessura, o menino, ao apontar o irmão (“Foi ele!”), está fazendo uma delação premiada, pois ao delatar o irmão, o menino receberá da mãe um prêmio: não levará nenhuma chinelada, todas reservadas ao delatado. O Velhote do Penedo prefere morrer a denunciar alguém. Mas o Velhote é do passado, pois hoje a delação é valorizada.

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, acredita piamente nas delações e no princípio aético de que “os fins justificam os meios”. Ou seja: no princípio usado pela mãe que pede ao filho que denuncie o irmão – o que livrará o dedo-duro das chineladas.

No acordo de delação premiada negociado com Joesley e Wesley Batista, Janot inovou, ou seja, foi muito além: deu aos delatores bônus, vantagens e prêmios enormes. Se Janot fosse a mamãe do exemplo acima, ela depois de “chinelar” o denunciado, daria sorvete, bolo e refrigerante ao denunciante. Janot tem um senso de justiça, no mínimo, estranho.

Em artigo publicado no UOL, o procurador-geral, o estranho Janot, justifica o acordo com os Batistas ao afirmar que o fez porque tinha “certeza de que o sistema de justiça criminal jamais chegaria a todos esses fatos pelos caminhos convencionais de investigação”. O que serão “caminhos convencionais de investigação”? O que serão, por outro lado, “caminhos não convencionais de investigação” – caminhos aparentemente seguidos por Janot? Tortura seria um método não convencional de investigação?

Tudo leva a crer que, para Janot, vale tudo - desde que os objetivos colimados sejam atingidos. Janot confessou ser partidário do emprego de meios não convencionais no sistema de justiça criminal. Trata-se de uma convicção que nos faz lembrar o general Nilton Cruz.

Não sei, mas ao ler o artigo do Janot lembrei-me de uma frase torpe do ditador Geisel a respeito da tortura: “Acho que a tortura em certos casos torna-se necessária para obter confissões”. Inacreditável, não? Geisel declarou tal monstruosidade no livro-depoimento organizado por Maria Celina D’Araújo e Celso Castro. Tortura é, segundo a pedra filosofal de Janot, “um caminho não convencional de investigação”?

Peço agora aos meus amigos que releiam o que foi escrito até aqui. E façam um paralelo entre a mamãe (do meu exemplo), o Janot (e seu estranho senso de justiça) e o comentário do ditador Geisel sobre a tortura. Algo une os fatos: a ideia funesta de que os fins justificam os meios.

Termino essa postagem dizendo três coisas:

1 – Se alguém discorda do que eu escrevi, não perca tempo fazendo comentário. Não vou polemizar.

2 – Considero a delação premiada uma coisa útil, mas ela se confunde com a deduragem, muito em voga no tempo da deduragem. Bandidos estão se safando mediante delações premiadas, muitas das quais não passam de lama jogada no ventilador.

3 – Um dia, cruzei no Congresso com o Valdo Cruz e a Sadi, ambos da Globonews. Disse a eles apenas uma coisa: delatado não é réu. A Rede Globo tem o hábito, através da delinquência jornalística, de misturar tudo, de modo a não informar corretamente – ou informar de acordo com objetivos inconfessáveis.

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