Diário do Velhote do Penedo (5)
Meu irmão Ricardo, prematuramente falecido, quando ouvia de alguém
algo absurdo, usava uma expressão jocosa, com a qual criticava o autor da
pérola: “Pô, parece que bebe!”
A expressão me veio à memória quando li que Ana de Holanda, irmã
de Chico Buarque, se declarou “assustada” com a escolha de Regina Duarte para a
secretaria de Cultura. Ana de Holanda, que foi, sem deixar saudade, ministra da
Cultura no governo Dilma, afirmou ainda:
“Não posso comemorar o fato de Regina Duarte assumir, pois eu
esperava dela um posicionamento mais firme em relação às declarações de
Bolsonaro, de quando ele fala de filtro e faz defesa da censura”.
O Velhote do Penedo é contra a censura – e se ela for, um dia,
proposta pelo governo brasileiro, pela ONU, pelo Papa, por Jesus Cristo ou
todos juntos, ele será o primeiro a reagir e usar as armas de que dispõe para
combatê-la. Embora septuagenário, o Velhote irá para as ruas, fará pichações,
escreverá e divulgará pelos meios disponíveis a sua repulsa à censura ou ao
cerceamento da liberdade.
Não entendi os comentários de Ana de Holanda – logo ela que fez
parte de um governo que defendia abertamente, através do seu ministro da
Comunicação Social, Franklin Martins, o “controle social da mídia”, eufemismo
ou sinônimo petista de censura. Martins era companheiro de Ana na estrutura
governamental; ela, porém, nunca disse nada a respeito – nem mesmo de que
estava ou ficaria “assustada”. Lembrem-se todos que o “controle social da
mídia” consta do programa do PT, partido pelo qual a família Buarque de Holanda
parece ter verdadeiro xodó.
Tudo isso parece muito estranho ao Velhote do Penedo.
Quando o jornalista e professor universitário Paulo César de
Araújo escreveu “Roberto Carlos em detalhes” houve – para desgosto de todos nós
– um movimento favorável à censura do citado livro. Tal movimento, fomentado
pela ação que Roberto Carlos moveu na justiça contra o autor da biografia,
contou com o apoio público e escancarado, entre outros, de Paula Lavigne,
Caetano Veloso, Gilberto Gil, Djavan, Milton Nascimento, Fafá de Belém, Chico
César, Lenine, Erasmo Carlos e – eis: - Chico Buarque, irmão da assustada Ana
de Holanda. Tais artistas, que sempre posaram de democratas e progressistas,
alinharam-se no episódio – imaginem! – a Maluf, Feliciano e Bolsonaro, na época
simples deputado federal.
Como se dizia no passado a respeito do futebol, a vida é uma
caixinha de surpresa: enquanto Chico Buarque defendia a censura ao livro de PC
Araújo, ouviu-se a voz encantadora de Valesca Popozuda, enfaticamente contrária
à censura.
Aliás, a participação de Chico Buarque no episódio foi
particularmente acabrunhante. Chico não só defendeu a censura como negou, em
artigo publicado em “O Globo”, ter dada a PC Araújo um depoimento sobre Roberto
Carlos. Paula Lavigne, no programa “Saia Justa”, da Globonews, reiterou as
declarações de Chico Buarque – e aproveitou a ocasião para, muito cheia de si,
desqualificar o livro (que não lera), o autor (que não conhecia) e a editora
Planeta (que sequer sabia o que era).
A verdade é que, ao negar que tenha dado um depoimento ao PC
Araújo, Chico Buarque, citado entre aspas em “Roberto Carlos em detalhes”,
declarou que o autor da biografia do Rei era um mentiroso e, pior, um
criminoso, pois forjara declarações que ele não dera. Contudo, viu-se que se
havia um mentiroso no episódio este seria o Chico, pois PC Araújo divulgou a
fita e o vídeo da entrevista que o compositor havia lhe concedido.
Chico Buarque, diante das evidências, admitiu que errara,
afirmando que tinha esquecido da entrevista que dera a PC Araújo. A desculpa
foi esfarrapada – mas apenas mostrou que o caráter de Chico Buarque estava a
exigir uma lanternagem.
O livro “Roberto Carlos em detalhes” encontra-se até hoje
proibido. É hoje raridade bibliográfica. Os exemplares que já haviam sido
distribuídos, foram recolhidos das livrarias e do depósito (mais de 20 mil
exemplares). Depois, foram levados ao crematório, onde foram incinerados por
ordem de Roberto Carlos – e aplauso dos progressistas que defenderam a operação
nazista.
Entenderam agora por que o Velhote do Penedo, ao ler o comentário de Ana de Holanda, se lembrou da
expressão usada por seu irmão?