A
mim me parece que a mídia e o meio acadêmico elegeram a ministra Damares Regina
Alves como o elo fraco do governo, a ser combatido sem descanso. Vejo
jornalistas e acadêmicos deitarem sapiência a partir de frases da ministra,
como se eles fossem a cume do saber filosófico – ou, como diz o neto do Velhote
do Penedo, os “reis da cocada preta”. Muitos acadêmicos e muitos jornalistas gostam
de palpitar sobre o que não sabem ou sabem superficialmente. Alguns deles eu
conheço pessoalmente, e manjo como eles agem.
O
Brasil não tem uma oposição política capaz de propor e debater alternativas às
políticas governamentais. Dias atrás, li, com espanto, um artigo de um
economista cujo título diz tudo: “A burrice no poder”. O economista, que se
assume como importante intelectual, adotou a categoria “burrice” para explicar
a visão dos outros, dos inimigos, dos adversários, dos que não pensam como ele,
pois a dele seria enquadrada (e o foi, por ele mesmo, claro) na categoria
“inteligência”. Na opinião do economista, políticas não concatenadas à esquerda
não funcionam – e, com um exemplo, pontifica: “austeridade é burrice”.
Inteligência, segundo o economista, seria o esbanjamento, a gastança, o
déficit. Segundo ele, é disso que o capitalismo gosta.
É
assim que a chamada esquerda brasileira vê aqueles que eles enquadram no campo
da direita. Esquerda seria sinônimo de inteligência; direita, de burrice. Assim
caminha a humanidade, assim o mundo se explica, assim a esquerda brasileira
será engolida por Bolsonaro.
Li,
hoje, uma postagem no Facebook em que o redator fala do suposto despreparo do
Bolsonaro (usou, inclusive, a palavra “burrice”), lamentando, de antemão, o
papel ridículo que ele fará em Davos. Bobagem. Nenhum chefe de governo vai a
uma reunião dessas sem um corpo de assessores que o oriente e, inclusive,
escreva seus depoimentos. Aliás, o principal desse tipo de reunião ocorre nos
bastidores, onde ministros e assessores debatem e fazem os seus acertos.
Acordos nascem sempre em tais ambientes fechados.
Creio
que os partidos, jornalistas e acadêmicos que se apresentam como de esquerda
foram surpreendidos com a vitória de Bolsonaro, mas, por pura arrogância, não
admitem isso – e transformaram em ódio a sua frustração política. Foram a nocaute
– e não sabem o que fazer, a não ser debater picuinhas, miudezas – e, vemos
agora, lançar sobre os vencedores o epíteto de “burros” com a autoridade
própria dos “inteligentes”. Soube hoje que a modelo Giselle Bündchen, que
certamente jamais leu um livro, acusou o atual governo de pregar e estimular o
desmatamento. A brasileirada que se apresenta como donatária das questões
ambientais ganhou, enfim, uma líder – com a vantagem de ser bonita, rica,
sensual e viver nas doçuras europeias. O Velhote do Penedo lamenta apenas que,
na era PT, época em que foram desmatados quase 300 mil quilômetros quadrados, a
ambientalista Bündchen tenha mantido um silêncio ensurdecedor sobre o assunto. Percebam
o seguinte: os 300 mil quilômetros quadrados desmatados na era PT equivalem às
áreas somadas dos estados do Paraná (199 mil) e Santa Catarina (95 mil). Onde
estavam os ambientalistas e os sustentabilistas enquanto tal monstruosidade
ocorria? Onde estão os ambientalistas e os sustentabilistas que não denunciam a
destruição do baixo Rio São Francisco, agravada com as obras insanas da
transposição?
Em
mais de 13 anos no poder, o PT não levou a cabo nenhum grande projeto, a não
ser aqueles sustentados em estatísticas manipuladas por economistas partidários
e nas mágicas dos marqueteiros João Santana e Mônica Moura, os quais estão,
desde março de 2017, cumprindo pena de prisão domiciliar. O PT sequer fez a
reforma agrária, projeto que esteve sempre na linha de frente do discurso
petista. Os sem-terra que no início do governo Lula estavam acampados à beira de
estradas, continuam por lá, à míngua. Mas o tiro de misericórdia que matou o
PT, no entanto, foi o lodaçal de corrução no qual se atolou – e afundou.
A
última carga contra a ministra Damares teve como mote algo que ela disse em
2003 ou 2013 sobre a teoria evolucionista ter chegado às escolas. Notem: uma
frase tola, sem profundidade, que não significa nada, mas que deu pretexto a
uma enxurrada de tolices e infantilidades. Uma frase que, por sua
desimportância, não mereceria crítica ou comentário.
As
convicções religiosas da ministra são pessoais – e ela, aceitemos ou não, tem o
direito de ser católica, protestante, budista, vascaína, umbandista, vegetariana,
vegana, fumante, pastora e ministra. O que se espera da ministra é que ela seja
eficiente em assuntos da mulher, família e direitos humanos, que são, estes
sim, os objetivos da pasta que lhe cabe gestar. Otto Maria Carpeaux, Alceu
Amoroso Lima (Tristão de Athayde), Hélio Silva, extraordinários intelectuais,
eram religiosos e criam em Deus – e seria estupidez negar qualidade e mérito em
seus livros e opiniões.
O
próprio Charles Darwin reconheceu que religião e evolucionismo não se
misturavam e, mais ainda, não se excluíam. Vejam o que ele escreveu em “A
origem das espécies”:
“Quanto aos meus
sentimentos religiosos, acerca dos quais tantas vezes me têm perguntado,
considero-o como assunto que a ninguém possa interessar senão a mim mesmo.
Posso adiantar, porém, que não me parece haver qualquer incompatibilidade entre
a aceitação da teoria evolucionista e a crença em Deus”.
Darwin
jamais opôs ou conciliou seus estudos científicos à religião que professava. Jamais
fez proselitismo político ou científico – nem procurou explicar a evolução
natural como produto da engenhosidade de Deus, que teria dado à natureza
“poderes” de evoluir e se transformar.
O
Velhote do Penedo conheceu e conviveu com inúmeros cientistas das áreas
naturais, biológicas, físicas e químicas, que jamais negaram a existência de
Deus e da importância da religião na vida das pessoas. Não são poucos os
cientistas e filósofos da antiguidade ou clássicos que jamais esconderam a sua
religiosidade. Descartes e Galileu eram cristãos confessos. Max Planck, físico
alemão, pai da física quântica e ganhador do Prêmio Nobel de 1928, foi
taxativo:
“Para onde quer
que se dilate o nosso olhar, em parte alguma vemos contradição entre Ciências
Naturais e Religião; antes, encontramos plena convergência nos pontos
decisivos”.
Karl
Marx, ao afirmar que a “religião é o ópio do povo”, não estava rotulando a
religião como mecanismo de dominação ideológica ou instrumento de subordinação
política. Os partidos comunistas adotaram o materialismo – ou o ateísmo – como
única linha filosófica articulada ao marxismo. Em alguns momentos, inclusive,
foram perseguidos e punidos os comunistas e simpatizantes que não se assumissem
ateus. O obscurantismo e a intransigência ideológica eram traços marcantes dos
partidos comunistas.
Marx
chegou a dizer que a religião era “uma realização fantástica da essência
humana”, pois se tornara a razão geral de consolo e justificação face um mundo
cruel, “um mundo sem coração, pelo espírito de uma época sem espírito, pela
miséria real”. A religião não seria, portanto, um mecanismo de alienação
humana, oposta ao marxismo, mas um refúgio humano contra as mazelas da vida. “A
angústia religiosa”, acentuou Marx, “é ao mesmo tempo a expressão da dor real e
o protesto contra ela. A religião é o suspiro da criatura oprimida, o coração
de um mundo sem coração, tal como o é o espírito de uma situação sem espírito”.
A comparação da religião com o ópio e a visão de que a religião incapacita o
homem a enfrentar a realidade é equivocada, típica de um compreensão torta do
fenômeno social. Quando se lê Marx, aprende-se muita coisa.
A
comparação da religião com o ópio já aparece em escritos de Immanuel Kant,
Johann Herder, Ludwig Feuerbach, Bruno Bauer, Heinrich Heine. Este último, em
1840, no seu ensaio sobre Ludwig Börne, observou:
“Bendita seja a
religião, que derrama no amargo cálice da humanidade sofredora algumas doces e
soporíferas de ópio espiritual, algumas gotas de amor, fé e esperança”.
Se
a religião, tomada como uma compreensão imutável da vida, bloqueou durante
séculos o avanço do conhecimento, não se pode esquecer, ou deixar de lado, a
intransigência dos heréticos comunistas, como bem lembrou A. da Silva Mello, em
“Religião: prós e contras”, cujos métodos e propaganda “é uma repetição do que
ocorreu em épocas de intolerância religiosa”.
Enfim,
a teoria da evolução chegou às escolas, disse Damares, e isto é verdadeiro.
Perfeito. Mas o Velhote do Penedo se sente no direito de perguntar: era
necessário, em contrapartida, expulsar o ensino e o debate religioso do nosso
convívio? Por que não introduzir o
ensino e o debate religioso, de modo a entendermos a religião como um protesto
e uma forma de refúgio contra a miséria real em que o homem vive?
Nada como ter profunda cultura. Você falou tudo o que sinto, mas, jamais eu teria a erudição de expor meus sentimentos em palavras. Parabenizo-me por conhece-lo. Beijos neydealdebaran125@gmail.com
ResponderExcluirBrilhante artigo! À semelhança do "burro" Reagan, desprezado pela "intelectualidade", o "burro" Bolsonaro fará o governo que o país merece e calará para sempre a esquerda, esta sim, verazmente burra!
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