Diário do Velhote do Penedo (10)
Não há mais esquerda ou direita em política. Os que se dizem de
esquerda no Brasil ou são desinformados ou são nostálgicos de uma ideologia que
virou fumaça com a derrocada da antiga União Soviética. No Brasil de hoje, são
de direita todos que não se dizem de esquerda. Pelo menos, é o que esses
últimos pensam.
A soma de desinformados e nostálgicos produziu no Brasil partidos
como PT, PSTU, PCdoB, Psol e outras bobagens que não conseguem sequer
apresentar um projeto nacional ou um plano de recuperação econômico. Ficam,
então, a repetir o velho discurso dos anos 1950, 1960, como se ele explicasse e
desse conta do mundo de hoje. É incrível, mas alguns dos desinformados e
nostálgicos se dizem stalinistas, trotsquistas ou coisa que o valha, sem
perceber o alcance e o significado do que dizem.
No mundo acadêmico, mormente nas áreas sociais e humanas, esse
cenário chega ao absurdo. Sem condições de criar uma interpretação consistente
das questões de hoje, inclusive por falta de autores novos franceses em quem se
espelhar, grande parte dos professores das áreas sociais e humanas submergem na
repetição das falas de Marx (que pouquíssimos leram), Foucault, Derrida e Habermas,
dos quais leram apenas apostilas.
Os estudantes (de esquerda), em sua maioria, supõem ser possível
resolver todos os problemas na base do grito – e, como não têm o hábito da
leitura, apenas repetem, sem qualquer juízo crítico, o entulho atochado nos
seus ouvidos por seus professores. E como tudo – ou quase tudo - que recebem dos
mestres está superado, vencido pelas reviravoltas de um mundo que se transforma
em ritmo alucinante, os estudantes pensam mal, falam mal, escrevem mal. Estão
fora do mundo civilizado, cujo fundamento está na escrita e na leitura.
Como são desinformadas e nostálgicas (às vezes são as duas coisas,
em dosagens variadas), as esquerdas brasileiras tentam compensar suas
deficiências (que eles não percebem que têm) ao apostrofar que os outros, os
que não estão com eles, ou sejam, aqueles que eles denominam de direita, são
incultos, burros e safados. Trata-se, sem dúvida, de uma compensação. Na
verdade, os desinformados e nostálgicos sofrem pelo que são, pois, no fundo,
não vêm perspectivas para si e para o mundo ideal, a maquete socialista, que
assombra suas mentes, como um espectro. A derrocada do ideal socialista
criou-lhes enorme sensação de vazio existencial, daí a fúria com que atacam aqueles
que não pensam como eles e não lhes dão apoio. Para essa gente, a vida é um
inferno.
O certo é que o esquerdismo dos desinformados e nostálgicos
(daqueles que se declaram hoje de esquerda no Brasil) não é marxista – e, sim,
uma espécie de fé, de crença mística.
Em recente artigo, Luiz Carlos Azedo discute as críticas de Tony
Judt (em “Pensando o século XX”) ao historiador Eric Hobsbawn, que se mostrou
relutante em reconhecer os equívocos e erros da antiga União Soviética. “Judt
também critica Hobsbawn”, nota Azedo, “por justificar o terror stalinista e as
coletivizações forçadas com o esforço de guerra”. A esquerda brasileira tem a
mesma postura, ou seja, as mesmas dificuldades de Hobsbawn para fazer
autocrítica. E, por isso, comete e persiste nos mesmos erros.
Em “A poeira da glória”, Martim Vasques da Cunha fez uma análise
criteriosa da obra de Antônio Cândido – e demonstrou que o autor de “Os
parceiros do Rio Bonito” vendeu aos seus leitores a ideia de “reformador
social”, ou seja, um sujeito de esquerda. Sua intenção era a de manter a ideia
que seus leitores têm dele. Este é outro traço do comportamento da esquerda
brasileira. Supor que como sujeito de esquerda, seus comentário possuem valor
“per se”. Tanto os desinformados como os nostálgicos supõem possuir
inteligência que os distinguem dos sujeitos ditos de direita.
Vou fazer agora um comentário pessoal. Durante décadas, acreditei
no ideal socialista – e reconheço que fechei os olhos para os muitos erros e
crimes cometidos em nome do socialismo real, como a miserabilidade dos crentes,
a formação de uma burocracia dominante e corrupta - e da violência
institucional comandada por Lênin e Stalin. Hoje, tenho consciência de que o
socialismo real acabou. Acredito também que o capitalismo é o regime, por
excelência, da exploração e da concentração, que não reúne nenhuma complacência
para com o povão. Não acredito que o capitalismo tenha condições de atender os
bilhões de miseráveis que habitam o planeta.
Em síntese: o socialismo acabou e o capitalismo não dá conta de
alimentar mais de seis bilhões de viventes. A saudosa maloca, os sonhos de
todos nós, afundou – e só nos resta cantar: “saudosa maloca, maloca querida,
did-di-donde, nós passemos os dias feliz de nossa vida”.
Este, enfim, foi o mundo que todos nós, de uma maneira ou de
outra, em maior ou menor proporção, criamos. Vivemos num mundo sem saída. Não
temos escapatória.
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