Jornal do Velhote do Penedo
Terça-feira,
28 de outubro de 2013 - Número 12
Um jornal a serviço de ideias desabusadas
Explosões de ódio
No
anoitecer do dia 28 de março de 1968, os estudantes que se reuniam no
Calabouço, restaurante estudantil situado próximo ao Aeroporto Santos Dumont,
no Rio de Janeiro, foram surpreendidos por uma invasão de policiais militares,
armados de escopetas. Acuados, aos estudantes só restava lançar pratos,
talheres, pedras e paus nos megalhas e gritar palavras de ordem contra a
violência que apenas começava. De repente, um tiro acertou o peito do estudante
Edson Luis Souto, que morreu na hora. Edson Luís tinha 17 anos.
Esta
semana, na região de Jaçanã, na Grande São Paulo, quarenta e cinco anos depois
da morte de Edson Luiz, um estudante (tinha também 17 anos) morreu ao ser
alvejado por um balaço desferido por um milico. Os meios de comunicação pouco
falaram do fato: não divulgaram o nome do jovem, não mostraram cenas do seu enterro,
não descreveram a sua vida. Nada. Apenas disseram que, segundo porta-voz da PM,
o tiro que matou o estudante foi um lamentável acidente.
Talvez
essa seja a diferença entre ditadura e democracia: na primeira, a morte de um
estudante passa em brancas nuvens; na democracia, a morte de um estudante
merece, pelo menos, uma explicação idiota.
A
verdade é que os comentaristas e narradores das TV Globo e GloboNews limitaram-se
a exibir as cenas da reação popular: quebra-quebras, saques de lojas e caminhões,
utilizando a linguagem que o boletim interno das duas emissoras exige que eles
utilizem: “vândalos”, “delinquentes” e “baderneiros”. Quando Edson Luís foi
assassinado, a TV Globo sequer deu notícia do fato. A Globo e a ditadura eram
assim, assim, ó!
O
que a imprensa televisiva não percebe é que a população brasileira,
principalmente a do Rio de Janeiro e São Paulo, está explodindo diante da
politicagem que condena o Brasil a ser sempre um “gigante deitado” ou, na
melhor das hipóteses, “um país do futuro”. As cenas mostradas pela televisão na
região de Jaçanã são evidentes: os ditos “baderneiros” eram gente pobre,
provavelmente desempregada, sem escolas, sem hospitais, obrigados a utilizar
transportes coletivos que não valem nada. O próprio jovem que foi assassinado
pela polícia acordava todos os dias às quatro e meia da manhã, trabalhava numa
lanchonete e não estudava por falta de tempo. Não tinha entrada na polícia. Os “quebra-quebras”
são manifestações de ódio (principalmente) dos jovens alijados de uma sociedade
onde poucos, pouquíssimos, podem usufruir de bens e mercadorias. São jovens
muito pobres, que vivem numa sociedade que estimula o consumo, mas que não lhes
permite o consumo mínimo.
A
sociedade brasileira não está sabendo lidar com o problema das manifestações e
da violência que explode diariamente nas ruas das cidades brasileiras. Contra
tudo isso, temos governos inoperantes, demagógicos, incapazes de enfrentar os
graves problemas sociais. O PT se sente reconfortado com a bolsa família e,
agora, com a privatização do pré-sal. Em junho, quando das primeiras manifestações,
Dilma, Renan, governadores e prefeitos prometeram reformas, ações, decisões,
pareciam dizer: agora, a coisa vai! Não foi. Continuamos atolados na nossa
inércia e na crueldade ética, moral e política dos governantes e políticos
brasileiros.