O descaminho brasileiro
Fazer política no Brasil é
ter vocação suicida. Ou ter tendência ao banditismo.
Sabemos que, ao longo do
tempo, houve uma deterioração da vida política brasileira, ao ponto de Sarney
ser definido como “inatacável” pelo Lula, que foi chamado de “o grande líder da
organização criminosa”, segundo as delações que correm por aí. Artistas e
intelectuais perdem a vergonha, e passam a defender descaradamente bocas,
boquinhas e grandes bocas – e a isto chamam de defesa de democracia e da
cultura. Palavras como direita e esquerda não só perderam o sentido, como se
mesclaram, produzindo um tipo de posicionamento político que aceita e convive
com canalhices variadas. Impeachment de uma presidente incompetente, que nos
conduziu a uma crise econômica de difícil solução, ganha o nome de golpe, o que
é, antes de tudo, uma leviandade sociológica e gramatical.
Quando uma pobre adolescente
é currada por um bando de desajustados e infelizes, muitos se dão conta que a
sociedade brasileira está enferma, muito enferma, pois já houve casos iguais, e
tão escabrosos, em outros estados brasileiros. Claro, queremos que os
delinquentes sejam punidos – e severamente. Mas os crimes, sejam os de
colarinho branco, sejam os demais, continuarão a prosperar, pois ninguém, na
verdade, se interessa em saber a origem de tudo isso. Somos um povo que adora o
lugar comum, nunca a busca inteligente de explicações e saídas. Nenhuma
universidade brasileira consta da lista das 200 melhores universidades do
mundo. Pensamos pouco. Mas isto pouco nos interessa.
Somos um país que vive de
fantasias, que custam caro e penalizam os mais pobres. Todos sabiam que a Copa
do Mundo e as Olimpíadas iriam nos custar muito caro, iriam permitir sobrepreços
e superfaturamentos e nos tornar donos de imensos “elefantes brancos”. Todos
sabiam, mas todos acharam e acham “bacana” sermos anfitriões de jogos que nos
custaram (e custam) os olhos da cara. Os milhões de desempregados, os infectados
por mosquitos vagabundos, não entraram nas nossas cogitações
Somos todos culpados,
sobretudo aqueles que se sentem portadores de verdades históricas irremovíveis,
próprias do século XIX. Enquanto alguns ficam gritando contra o suposto “golpe”
que apeou do poder um governo apodrecido, 12 milhões de brasileiros estão
desempregados, 60 milhões são inadimplentes, milhares estão fora da escola,
pois as escolas são ficções educacionais, ruins e superadas, os hospitais
públicos assemelham-se a pardieiros. 44% da população do Brasil não lê; 30%
nunca comprou na vida um livro sequer; 74% não adquiriu um livro nos últimos
três meses. D. Dilma entregou 7,5 mil casas das 61 mil prometidas desde 2009.
Enquanto isso, a filha de Luiza Trajano, dona da rede de lojas Magazine Luzia,
recebeu meio milhão, via Lei Rouanet, para fazer um livro de receita. Alguma
coisa está errada no país do futuro.
Somos um povo que convivemos
com a miséria, a estupidez, a ignorância e a violência, achando que temos só
direitos, nenhuma obrigação ou dever ou responsabilidade. Herdamos e cultivamos
ódios, ressentimentos, ressaibos, lutas sem sentido, preconceitos. Somos um
povo generalizadamente desinformado, mas que gostamos de palpitar sobre tudo.
Não desejamos qualidade, mas quantidade. Não acreditamos no mérito, mas no
jeitinho. Não gostamos de cumprir papéis, mas de ver gente fazendo o que deveríamos
estar fazendo. Não amamos virtudes – e, sim, o nepotismo, o fisiologismo e a
canalhice.
A maioria do povo brasileiro
não vive, mas, como dizia Cláudio Abramo, sobrenada.
Com estas amargas reflexões,
encerro por hoje. A vida brasileira é repetitiva, mas como escreveu Dias Gomes
numa peça famosa, “naquele tempo, pelo menos éramos campeões do mundo!”